Comissão especial na Câmara discutiu proposta de “vínculo de experiência” de futuros servidores. “Lógica da República Velha”, diz deputada
Concurso público e vínculo de experiência eram os temas da audiência pública desta terça-feira (13) da comissão especial que analisa a proposta de “reforma” administrativa. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 32 define cinco tipos de vínculos: vínculo de experiência, por prazo determinado ou indeterminado, cargo típico de Estado e de liderança ou assessoramento. Durante a audiência, foi apontada necessidade de “modernizar” o concurso, mas também foi questionada, por outro lado, a possibilidade de ampliação de situações de “compadrio” no serviço público, comprometendo a autonomia do servidor.
Para Gervásio Mata (PSB-PB), por exemplo, a “deforma”, como ele se refere ao projeto, traz “um risco gigantesco de favorecimento político” com o chamado vínculo de experiência. “Se aprovado, representará um arrumadinho para o poderoso de plantão selecionar a seu bel-prazer quem será o escolhido num concurso público”, afirmou o deputado.
Desempenho e estabilidade
Pelo texto original, o vínculo de experiência seria uma etapa do concurso público. Para assumir um cargo típico de Estado, a pessoa deveria cumprir um período de pelo menos dois anos “com desempenho satisfatório”. E para ter estabilidade seria necessário um ano de efetivo exercício nesse cargo.
Por sua vez, a deputada Erika Kokay (PT-DF) avalia que a proposta permite ampliação da terceirização e do comissionamento. “Modernizar o Estado voltando à lógica do compadrio, da República Velha?”, questionou. Enquanto Alice Portugal (PCdoB-BA) criticou o prazo “exíguo” e o momento “completamente crítico” de discussão do projeto. Segundo ela, é um PEC “fiscalista, mal preparada tecnicamente, que atropela regras vigentes na Constituição”.
Profissionalização
Consultor da Frente Parlamentar Mista da Reforma Administrativa, Felipe Drumond afirmou que regras que protejam de perseguição política representaram um grande avanço, mas acrescentou que os concursos fazem uma “seleção metodologicamente ultrapassada”. O que, segundo ele, dificulta o próprio planejamento do serviço público. Além disso, seria preciso “profissionalizar” cargos e chefias de médio escalão, responsáveis pela avaliação de desempenho do servidor.
Para o professor de Administração Pública Fernando de Souza Coelho, da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (Each-USP), é preciso pensar não apenas no concurso, mas em políticas públicas de gestão de pessoal. “Muitas vezes o concurso é tratado de forma isolada, e não pensamos a relação com os diversos subsistemas de recursos humanos.” Assim, segundo ele, essas práticas, principalmente em estados e municípios, várias vezes são “anacrônicas”. Souza Coelho também fez críticas a concursos “que não conseguem aferir conhecimento”, além de “editais que não são revisados” e “falta de planejamento da força de trabalho”.
Ajuste fiscal
A PEC 32 tem a pretensão de remodelar o Estado brasileiro “com forte componente de ajuste fiscal”, destacou o economista Max Leno de Almeida, da subseção do Dieese na Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef). Ajuste que vem sendo aprofundado com outras medidas, como o teto de gastos e própria “reforma” da Previdência. Assim, acrescentou, muitos itens da proposta se baseiam nessa visão de redução do papel do Estado. E de “responsabilização dos servidores públicos pela situação em que a própria economia brasileira se encontra”.
O relator da PEC 32, Arthur Oliveira Maia (DEM-BA), pareceu ter se irritado com as várias críticas ao projeto. “Eu não posso me conformar com a ideia de que uma reforma administrativa não seja oportuna. Se o texto que veio não nos satisfaz, é outra história”, reagiu. “Temos toda a liberdade para podermos colocar no bojo da lei aquilo que entendemos ser um caminho para melhorar o serviço público brasileiro. Seria uma demonstração de incapacidade nós simplesmente dizermos que a reforma não presta”, disse o deputado. Arthur Maia também relatou a “reforma” da Previdência, em 2019, e a lei que flexibilizou as terceirizações em todos os setores de atividade, em 2015.
Vínculos precários
Rogério Correia (PT-MG) também chamou o projeto de “deforma” administrativa”. “Não melhora, desmancha o serviço público”, afirmou criticando ainda o ministro da Economia, Paulo Guedes, que na semana passada foi à comissão especial. “Não nos trouxe absolutamente nada, não trouxe um gráfico, um dado de como ele espera ter uma recuperação do serviço público. Ele fez conjecturas.” Para o deputado, com as mudanças os vínculos trabalhistas serão “completamente precários”.
A comissão especial terá ainda oito sessões de debates até a votação do parecer. A PEC 32 recebeu 62 emendas.