O Encontro do Movimento Pedagógico Latinoamericano de Minas Gerais encerrou-se na sexta-feira (08/07) após dois dias de intercâmbio, debates e palestras, conforme a proposta formulada pela direção do Sind-UTE/MG em conjunto com a CNTE e a IEAL (Internacional da Educação para América Latina), para fortalecer o movimento sindical no enfrentamento do golpe que ameaça os direitos dos trabalhadores da educação.

O momento atual tem confirmado o avanço neoliberal em toda a América Latina, numa onda crescente do conservadorismo com ataques sistemáticos para derrubar direitos dos trabalhadores. No segundo e último dia de programação do Encontro, essa realidade foi debatida a partir das experiências do México e da Venezuela. No Brasil, os trabalhadores da educação, liderados pela CNTE, têm feito uma resistência incansável contra o retrocesso no ensino público brasileiro combatendo medidas retrógradas como o fim da aposentadoria especial para o magistério, os ataques aos recursos do petróleo para educação, às tentativa de não implementação da Lei do Piso, entre outras bandeiras primordiais para a categoria.

Gabriela VasquezCom a presença de dois representantes do país, a exposição foi dividida entre a doutora Gabriela Vasquez, professora do programa de Pós-Graduação de Estudos Latino-Americamos da UACM (Universidade Autônoma da Cidade do México), e o professor José Antonio Altamirano Ojeda dirigente da CNTE (Coordinadora Nacional de Trabajadores de La Educación) do México em Oaxaca, região do país que tem passado por intensos conflitos entre trabalhadores da educação e a força militar do país.

A doutora Vazquez expôs o esvaziamento do magistério provocado pela Reforma Educativa imposta aos educadores mexicanos pelo governo do presidente Enrique Peña Nieto. Num sistema que não investe nada no magistério, os professores são culpabilizados pela má qualidade da educação com apoio da grande mídia que está à serviço dos governantes.

A lei do magistério busca razões para perseguir e punir os professores criando situações em que os concursos, por exemplo, são provas de múltipla escolha, obrigatórias para ingresso na carrreira e manutenção dos empregos, mas podem ser prestados por qualquer profissional sem necessidade de formação ou habilitação para o magistério. Para a professora Gabriela Vazquez, o maior problema da dita Reforma, é a desprofissionalização do trabalho docente no país. “Hoje os professores no México se manifestam intensamente contra essa Reforma que sucateia a educação pública e isso tem levado a uma maior organização da categoria contra todas as formas de repressão”, disse.


O professor José Antonio Altamirano Ojeda, concentrou sua exposição em explicar como o movimento sindical tem feito o enfrentamento, utilizando a presença constante nas ruas, fazendo protestos para exigir a revogação do que é imposto aos professores, especialmente a avaliação obrigatória do magistério incluída na reforma educacional de 2013.

Ele utilizou o espaço para denunciar as condições precárias dos professores mexicanos, que resultaram, nos últimos anos, em numerosos conflitos. O último, acontecido na zona de Oaxaca, causou seis mortes de trabalhadores, após policiais federais fazerem disparos com armas de fogo contra os manifestantes. “Agora, mais do que nunca, devemos continuar nesta luta, pois esses companheiros que perderam suas vidas, também se tornaram a referência de que rejeitamos o modelo neoliberal que querem impor para a nossa Educação”, marcou.

A reforma que os sindicatos e o movimento social anseiam para o México, é baseada em quatro eixos: pedagógico, jurídico, político e organizativo. Para isso, cada vez mais, há que se contrapor os interesses das oligarquias e o imperialismo financeiro. Entretanto, ainda há um longo caminho a percorrer, caminho esse que tem levado a tristes episódios, como o caso dos estudantes assassinados de Ayotzinapa, cujos corpos nunca apareceram, e também, ao fato de que existem nesse país, mais de 500 presos políticos, pessoas encarceradas por defenderem pensamentos diferentes do Estado. “Se não nos deixam sonhar, não os deixaremos dormir”, concluiu o professor Altamirano, sobre a disposição incansável para a luta.

Para falar sobre a experência venezuelana, o convidado foi o professor José Humberto Guariguata Osorio, Diretor Geral de Investigação e Formação do MPPE (Ministério do Poder Popular para a Educação), pasta de governo da Venezuela. Iniciou sua fala ressaltando que o imperialismo apenas avança, nunca retrocede, e lembrando que, muito antes do Presidente Hugo Chavez chegar ao poder e iniciar as transformações sociais que o povo venezuelano tanto ansiava, os grandes meios de comunicação já tratavam de demonizar as medidas que seriam criadas para os mais necessitados.

Ressaltando que antigamente os golpes tinham uma configuração clássica, onde o poder era usurpado com uso meramente de força, e que hoje, os golpes vêm travestidos de legalidade, porque a direita simplesmente não respeita os marcos legais, o professor Guariguata, defendeu que o campo da esquerda, deve ir além de transformar a arquitetura jurídica dos países, buscando fortalecer a consciência política, pois as bases que sustentam o poder que temos conquistado ainda são bases burguesas, alicerçadas para atender aos interesses dessas minorias de poderosos.

Em dezembro de 2015, a oposição venceu a eleição parlamentar na Venezuela e, nesse momento, a esquerda iniciou um exercício de autocrítica. Diante do fato que boa parte da população culpa o chavismo pela recessão e desabastecimento que vive o país, ficou evidente a falta da consciência política necessária para analisar e entender que foram os interesses do imperialismo no monopólio petrolífero que provocaram esse isolamento ao país. Por outro lado, o Presidente Maduro viu também a urgência de libertar o país da dependência exclusiva do petróleo, e instituiu o que chama de “Congresso da Pátria”, uma união entre a classe trabalhadora, governo e lideranças sociais para empoderamento do povo e fortalecimento do governo popular. Nesse sentido, a Educação tem tido papel importante e as escolas tem sido local de formação para as comunidades através de um programa chamado “Todas as Mãos à Semeadura”, que consiste em reunir a comunidade escolar (professores, estudantes, pais e outros interessados) aos sábados, para debater política e outras temáticas sociais e plantar legumes e verduras para consumo da comunidade, ou seja, o socialismo vivenciado na prática.

Fez críticas severas ao modo como, muitas vezes, a esquerda tem se comportado após chegar ao poder nos países latinoamericanos, chamou a uma reflexão para os novos tempos: “Temos que resistir mais, temos que chegar ao poder. Mas o que faremos com o poder? Se apenas chegar lá fosse suficiente, não teríamos perdido as eleições na Argentina, não teriam acontecido golpes como em Honduras e no Paraguai, e a realidade brasileira seria outra”, provocou. O professor José Humberto, concluiu defendendo a unidade e cooperação entre a esquerda latinoamericana, baseada em princípios de conhecimento, apoio e respeito mútuos, para a verdadeira libertação da Pátria Grande.

Houve um momento para lançamento da obra, organizada por Carol Proner, Gisele Cittadino, Marcio Tenenbaum e Wilson Ramos Filho. Reunindo, 103 artigos e entrevistas com professores/as, jornalistas, líderes de movimentos sociais, artistas e cientistas políticos, tanto brasileiros quanto estrangeiros, como Boaventura de Sousa, Leonardo Boff, Guilherme Boulos e Jandira Feghali a obra se coloca como instrumento na luta política que acontece no Brasil.

Os textos, analisam as causas, consequências e particularidades do processo de impeachment de Dilma Rousseff, ora em curso, explorando temas, como o papel do STF e dos atores políticos, a cobertura da grande imprensa, os desdobramentos da operação Lava Jato e o ataque às políticas de inclusão social. Para apresentar a obra durante o encontro, veio o doutor Alexandre Gustavo Melo Franco de Moraes Bahia, um dos colaboradores com os temas “Afinal, quem é o guardião da Constituição?” e “Golpe vergonhoso passa na Câmara”.

O professor Gaudêncio Frigotto é filósofo e doutor em Educação, História e Sociedade pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Atualmente, atua como professor na Faculdade de Educação e no Programa de Pós Graduação em Políticas Públicas e Formação Humana da UFRJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro).

Ele que tem sido um incansável militante das causas sociais da esquerda e acompanhado de perto a luta dos trabalhadores em educação, trouxe um olhar realista, mas esperançoso, sobre o horizonte que se desenha para o próximo período. Falou de como os solicialistas tem que estar nas ruas, pois é do pensamento socialista ser internacionalista e não entreguista, os socialistas não querem estar isolados e nem colonizados.

Valorizou todos os investimentos que os governos Lula e Dilma fizeram para a criação de Universidade e Institutos Federais, ressaltando que, aqueles que não enxergam esse grande avanço social, que abriu os portões de espaços que eram vetados à classe trabalhadora, foram doutrinados pela grande mídia. Não deixou de chamar a esquerda para uma autocrítica “Cuidados colegas, ninguém é contra o termo ‘competência”, mas o neoliberalismo prega que só há espaço para os mais competentes, falando daquelas competências demandadas pelo mercado”, lembrou.

Frigotto acredita que a esquerda não se deu conta de que a privataria, aos poucos, se infiltrou no projeto de governo. Através de algumas alianças, que foram necessárias para governar, a ideologia do mercado foi tomando o lugar da pedagogia libertadora que pregamos e acreditamos. “A burguesia nunca foi contra instruir, mas ela é contra educar”, frisou.

Incentivou uma luta esperançosa e aguerrida para tentar barrar o impeachment, especialmente para recompor minimamente a confiança de que o voto vale. “Chega de alianças com minorias prepotentes com uma maioria desvalida à margem! Hoje é momento de unir as forças progressistas. E para concluir, pergunto: qual é, na resistência, a nossa verdade substancial, profunda e inabalável?”, finalizou.

Os trabalhadores da educação participantes do Encontro do Movimento Pedagógico, encerraram as ativides do evento com um protesto em defesa de Educação e "Fora Temer". Centenas de manifestantes andaram pelas ruas de Belo Horizonte exigindo respeito para a categoria com palavras de ordem. Vestido de “luto” com a frase emblemática “eu LUTO pela educação”, empunhando velas e usando mordaças, numa referência a alguns projetos de lei que tramitam na Câmara do Deputados, a manifestação foi pacífica e deixou claro que os trabalhadores da educação de Minas Gerais não se calarão nem mesmo quando tentarem amordaçá-los.

“Continuaremos a denúncia dos golpes de estado, resistindo nas ruas e em luta pela pátria livre!”

Todos os debates e reflexões proporcionados durante o Encontro geraram a “Carta de Minas Gerais”, um documento que será amplamente distribuído entre os órgãos gestores da educação no Estado e também em nível federal.

Confira mais fotos do evento na página da CNTE no Facebook.

Cuiabá, MT - 12/07/2016 10:11:21


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